Desde
pequena tenho um fascínio por fogo e costumo
chegar cedo ao terreiro que frequento, não gosto de (tb não é correto) chegar após o início dos trabalhos e
sempre que tenho a oportunidade, acompanho a preparação da defumação pelos
filhos designados a função.
Em nossa casa há um filho, que sempre que olho para
ele vejo o cigano que o acompanha e em uma determinada data estava ele a
preparar a defumação utilizando um Fole, que é uma ferramenta usada
pelos ferreiros para atiçar fogo na hora da forja de metais, hoje também
utilizado para acender a churrasqueira, neste momento veio a visão de uma espécie de acampamento com algumas carroças e vários ciganos cantando e dançando em frente a uma fogueira, com
um deles a acendê-la com um instrumento
bastante parecido ao utilizado pelo filho da casa. Por isso iniciarei os contos
com este tema.
O Ferreiro e o Fole
O ferreiro e o fole andavam se
desentendendo para saber qual dos dois era mais importante no trabalho da
ferramentaria.
- Se te falto, de que forma poderás manter acesas as brasas
que tornam maleável o ferro que trabalhas? Sem mim és inútil e, por este
motivo, sou mais importante do que tu! – afirmava o fole cheio de vaidade.
Cansado de tanta amolação, o ferreiro foi pedir orientações
a Exu e, para agradá-lo, presenteou-o com uma belíssima faca.
No dia seguinte Exu compareceu pessoalmente à oficina e,
como era de hábito, lá estavam os dois discutindo e o serviço parado...
- É claro que és muito mais importante que este ferreiro inútil!
– disse Exu ao fole. – Queres ver o quanto ele é incapaz? – E dirigindo-se ao ferreiro:
- Anda sopre sobre as brasas! Quero ver se pode fazê-las
ficarem acesas a ponto de incandescerem o ferro.
E o podre homem, sem nada entender, começou a soprar inutilmente
sobre os carvões, e, por mais que se esforçasse, não obtinha nenhum resultado.
Os carvões mantinham-se apagados como no momento em que ali foram colocados.
- Vês o quanto és fraco e inútil? – gritou Exu, humilhando
ainda mais o ferreiro.
- Agora, amigo fole, mostra nos o quanto és poderoso. Deixa
que eu amarre tua boca à entrada da forja para que nada se perca do teu sopro
arrasador.
Tocado em sua vaidade, o fole permitiu que Exu amarasse sua
boca à entrada da forja e, com alguns poucos sopros, acendeu as brasas.
Imediatamente, os ferros ficaram incandescentes e prontos para ser trabalhados.
- Agora este tolo já sabe qual de nós dois é o melhor,
solta-me Exu, para que eu possa dar as ordens em seu trabalho! – solicitou o
fole cheio de orgulho.
- Soltá-lo? Mas por nada neste mundo!...- Surpreendeu Exu. –
Teu lugar é aí, com a boca sobre as brasas, atiçando-as para que o ferreiro
possa trabalhar em paz. Agora já deves saber qual dos dois é tolo e qual dos
dois é mais importante dentro de uma oficina.
A partir de então os foles têm suas bocas permanentemente
presas às forjas e, sempre que precisa de seus préstimos, basta ao ferreiro
espremer suas barrigas para que logo entrem em ação.
Texto
extraído do livro Lendas de Exu – Adilson Martins – ed. Pallas
https://www.amazon.com.br/Lendas-Exu-Adilson-Martins-ebook/dp/B016R0N3M8